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Administração de condomínios em Portugal

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Em Portugal existem cerca de 250.000 edifícios sob o regime da propriedade horizontal (condomínios), grande parte de pequena dimensão, onde reside cerca de 45% da população portuguesa

Foto: Banco de Imagens

A maior parte desses condomínios, especialmente os de pequena dimensão, são ainda administrados pelos próprios condôminos, sendo os restantes distribuídos pelas cerca de 1500 empresas que se dedicam à administração de condomínios. Destas, apenas uma pequena parte exerce a atividade em regime de exclusividade ou atividade principal, sendo comum encontrar-se empresas que têm outra atividade principal, como a mediação imobiliária, contabilidade, limpeza, jardinagem, etc., sendo a administração de condomínios uma atividade secundária.

Apesar do direito português e do direito brasileiro terem ambos forte influência do direito romano e a estrutura dos seus principais códigos (civis) ser idêntica, os regimes jurídicos da propriedade horizontal apontam para realidades diferentes, especialmente no que respeita à administração.
Enquanto no Brasil a administração do condomínio pode ter duas entidades distintas (o síndico e o administrador), em Portugal existe apenas a figura do administrador do condomínio, eleito ou nomeado pela assembleia de condôminos, que tem funções semelhantes às do síndico.
Em Portugal o condomínio tem apenas dois órgãos: a assembleia de condôminos, que é o órgão deliberativo e o administrador do condomínio, órgão executivo. Não está legalmente previsto o conselho fiscal, ao contrário do que prevê o Código Civil (CC) brasileiro, nem o conselho consultivo.

Vitor Manuel Reis Amaral, Presidente da direção da Associação Portuguesa de Administração de Condomínios – APEGAC, Advogado licenciado em direito pela Universidade Católica Portuguesa, com pós-graduação em direito do urbanismo e Empresário de administração de condomínios, há 26 anos. / Foto: Divulgação

Segundo Vitor Manuel Reis Amaral, Presidente da direção da Associação Portuguesa de Administração de Condomínios – APEGAC outras diferenças são dignas de registo como é o caso de no Brasil o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio (artº 1.345 do CC), enquanto que em Portugal o alienante é o único responsável pelo pagamento das prestações vencidas até à data da transmissão da fração (que é o mesmo que unidade, termo usado no Brasil). “Isto também contribui, muitas vezes, para uma maior dificuldade de gestão financeira do condomínio, porque são muitas as situações de créditos incobráveis. A associação portuguesa do setor (Associação Portuguesa das Empresas de Gestão e Administração de Condomínios – APEGAC), de que fui presidente da direção (atualmente sou o presidente da Assembleia Geral), há vários anos que reclama junto da tutela que esta situação se altere, impondo a obrigação de apresentação, na altura da escritura de compra e venda ou outorga de outro documento de transmissão da propriedade, duma declaração de dívida ou de não dívida, emitida pelo administrador do condomínio, de forma a vincular o adquirente que aceitasse aquele ónus, à semelhança do que se faz noutros países, como acontece na vizinha Espanha” compara Amaral.

No Brasil o condómino com dívidas ao condomínio só pode votar na assembleia de condóminos “estando quite”, razão porque, tendo dívidas ao condomínio, está impedido de votar. Em Portugal, independentemente do valor que o condômino tenha em dívida, não lhe pode ser cortado o direito de participar e votar na assembleia de condóminos.

Pela legislação portuguesa, cada condômino é proprietário exclusivo de uma fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício. Tais direitos estão fundidos e não podem ser alienados separadamente, não sendo possível renunciar à parte comum para evitar o pagamento das despesas do condomínio, como acontece no Brasil.
Em Portugal os “abrigos para veículos”, como se encontra designado no CC brasileiro, podem ser alienados (desde que sejam frações autônomas – unidades) ou arrendados (alugados) a pessoas estranhas ao condomínio, sem qualquer necessidade de estar previsto no regulamento (convenção) do condomínio, ao contrário do que sucede no Brasil.

Pelo que dispõe o artº 1.353 do CC brasileiro, é permitida a realização da assembleia, em segunda convocação, podendo esta “deliberar por maioria dos votos presentes”; porém, em Portugal a assembleia só poderá deliberar em segunda convocação desde que, nessa altura, esteja presente ou representado, no mínimo, um quarto do valor total do condomínio.
A difícil situação econômica que abrange muitas famílias, faz com que as prestações condominiais sejam, muitas vezes, as últimas a pagar, criando dificuldades de gestão à administração do condomínio. A inadimplência no Brasil não só tem como consequência a impossibilidade de votação na assembleia, como é punida com a aplicação de multas legalmente previstas. Em Portugal, é necessário que as multas sejam fixadas pela assembleia de condôminos e ou estejam previstas no regulamento do condomínio, existindo apenas uma cláusula no CC que não permite que as sanções excedam, em cada ano, um quarto do rendimento coletável da fração. A ata da assembleia de condôminos que tenha aprovado o orçamento do condomínio e as respetivas contribuições de cada condómino, com a respetiva data de vencimento, é título executivo, o que permite ao administrador executar judicialmente a dívida que, não sendo superior a dez mil euros (o que é pouco comum), tem como consequência a imediata penhora de bens, sem prévia citação do devedor.

A Lei do Locatário brasileira prevê que o locatário pague as despesas ordinárias, cabendo ao locador apenas as extraordinárias. Em Portugal, mesmo que o contrato preveja que compete ao locatário pagar as despesas do condomínio, a obrigação de pagamento pende sempre sobre o proprietário da fração/unidade.

Em Portugal, como no Brasil, assim como em grande parte dos países ocidentais, os problemas da vida em condomínio e as dificuldades de gestão são comuns, agravados pela difícil situação pandêmica que o mundo atravessa, com consequências sociais e econômicas, entre outras. Há cerca de um ano que as administrações de condomínio estão impossibilitadas de realizar assembleias de condôminos presenciais, o que conduz à falta de apresentação e aprovação das contas do exercício econômico anterior; à não aprovação do orçamento para o exercício seguinte, tendo como consequências a manutenção do valor das contribuições dos condôminos quando, em muitos casos, os orçamentos se mostraram deficitários; ao adiamento da aprovação e realização de obras de manutenção e conservação, entre outros.

Recentemente (1 de fevereiro de 2021) a Assembleia da República Portuguesa aprovou uma lei (Lei nº 4-B/2021) que contém uma norma (artº 5º-A) que prevê a realização de assembleias de condôminos através de meios de comunicação à distância no ano 2021.

Como qualquer lei que é feita apressadamente, pelas circunstâncias que vivemos e a necessidade do legislador intervir rapidamente em várias áreas da vida em sociedade, encontramos-lhe defeitos, por falta de concretização, inaplicabilidade ou até por omissão. Porém, as administrações de condomínios e os condôminos, têm agora mais uma possibilidade de realizar assembleias para além das presenciais, seja por videoconferência ou no modelo misto (parte presencial e parte por videoconferência).
Com esta norma, o legislador português, primeira vez, permite a comunicação por correio eletrônico entre administração e condôminos. Ora, admitindo o legislador essa possibilidade (embora numa situação especial), dificilmente não a admitirá para o futuro, alargando-a a todo o gênero de comunicação, como a convocação das assembleias e a notificação das deliberações aos condôminos ausentes.

Outra vantagem desta norma, é o seu efeito retroativo, permitindo a validação das assembleias virtuais que até aqui tinham sido realizadas e a validação das respetivas deliberações.

São também alguns os defeitos, desconformidades e omissões desta lei, destacando-se o facto de impor que os condôminos fundamentem a falta de condições para participar na assembleia através de meios de comunicação à distância, sem que essa fundamentação esteja devidamente concretizada, abrindo a possibilidade de criação de conflitualidade entre a administração e condôminos. Pior ainda, é o fato de prever que cabe à administração do condomínio assegurar os meios necessários para que os condôminos possam participar nas assembleias por videoconferência; No entanto, a única pena para o não cumprimento desta absurda obrigação, é a não realização da assembleia por aquele meio, passando a realizar-se no modelo misto ou no tradicional, ou seja, presencialmente. Isto só reforça que as assembleias virtuais ou em modelo misto, são apenas mais uma opção para a administração e condôminos.

Em Portugal, cerca de 60% da população não tem computador em casa, não tem smartphone, internet, ou não tem conhecimento para manuseamento das novas tecnologias, incluindo as plataformas de comunicação à distância, razão porque não se pode impor a realização das assembleias virtuais; já quanto ao modelo misto, entendo que será o caminho a percorrer.

No Brasil, onde já existe algum histórico de realização de assembleias por videoconferência ou no modelo misto, parece que o resultado se traduz numa maior participação dos condôminos, redução da falta de objetividade que existe muitas vezes nas assembleias presenciais e uma economia de tempo e dinheiro.

As empresas de administração de condomínios têm um caminho a percorrer de adaptação a esta nova realidade, devendo estar receptivas à mudança, sob pena de serem ultrapassadas ou até absorvidas por quem for mais expedito na sua modernização.

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